terça-feira, 12 de maio de 2020

Sobre roubar rosas


Uma vez eu roubei uma rosa. Foi assim. Todas as manhãs eu passava pela casa de janelas grandes e grades altas onde rosas de todas as cores se entrelaçavam. Era dia do professor e eu ficara de levar uma flor pra professora e logo pensei nas rosas da casa de janelas grandes. Nessa noite meu sono foi agitado e pela manhã acordei mais cedo do que o costume. Sai de casa com o coração aos pulos, pois já via as rosas frescas, molhadas de orvalho, delicadamente penduradas na grade. Escolhi a mais bela e me espetando nos espinhos, cuidadosamente cortei a rosa. Linda. Vermelha. Perfumada.
A janela grande abriu e a dona da roseira gritou comigo furiosa. Eu olhei e falei “É só uma” e segui meu caminho.
Quando voltei da escola, mal entrei em casa fui agarrada pelos cabelos por uma mãe furiosa e cheia de vergonha pelo roubo que a filha tinha feito. Argumentei que “não era roubo”, que “a rosa ia morrer em dois dias”, que a “professora tinha ficado feliz”. Não adiantou: “era roubo”, “feio”, “não se mexe nas coisas alheias”, “podia ter pedido”, “como olhar pra cara da vizinha agora?”. Isso tudo entremeados a muitos tapas e pescoções.
Enfim, isso me ensinou a não roubar rosas, a não mexer no que é alheio e ajudou a me tornar uma pessoa capaz de se revoltar com os que o fazem sem escrúpulos. É indigno, é nojento ver o que está acontecendo com os recursos destinados ao combate à COVID-19 no Brasil. Roubar dinheiro de máscaras, respiradores, EPIs, desviar recursos, superfaturar são atitudes de pessoas que não têm escrúpulos, que não foram educados a respeitar o alheio, que não tem empatia, solidariedade, amor. Que só querem lucrar, mesmo que haja pessoas morrendo em consequência de seus crimes. Que eles sejam denunciados, punidos, fiscalizados por todos aqueles que aprenderam que roubar é feio, vergonhoso - mesmo que seja uma rosa, linda, vermelha, perfumada!
                                                                                  Marli Godoi

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